Quando eu tinha uns 12 anos, Lilian, minha amiga e xará, veio com uma novidade incrível.
– Vamos lá na loja Yamamura, quero te mostrar algo diferente que você vai adorar.
Era o início dos anos 70 e da loja de lustres, que cresceu incrivelmente nos anos vindouros.
Ficava numa rua entre a Rua da Consolação e a Avenida Angélica, era pequena e guardava um segredo bastante difundido na colônia nipônica, um cabelereiro no fundo da loja.
É claro que precisávamos ir lá.
Aliás, foi daí que nasceu minha curiosidade em conhecer cabelereiros de todos os tipos, em qualquer lugar do mundo em que eu esteja. Minhas amigas se divertem com minha falta de fidelidade e eu acho estranho o contrário.
Vai que dentro de uma loja de tapetes na Turquia, você ache um lavatório?
Confesso que essa foi uma experiência fadada ao insucesso, com desaprovação instantânea da minha filha: Ai, mãe, nesse lugar nem devem saber esterilizar os instrumentos! Bom, achei higiênico, mas de fato meia boca na técnica aplicada, com o saldo de uma unha encravada que deu um pouco de trabalho, no entanto a massagem nos pés era divina e os tapetes maravilhosos.
Outra vez em Kuala Lumpur, na Malásia, minha amiga Silvia e eu, para resetar um mês de Bali e adjacências, nos enfiamos em outro lugar bizarro, com os pés num tanque estranho, as mãos em outro e os cabelos sendo vigorosamente esfregados sabe-se lá com o quê. E sem entendermos uma única palavra do que nos perguntavam. Saímos de lá rindo, pois, nossos cabelos nos assemelharam ao homem de palha do Mágico de Oz. Só nos restava seguir o “caminho das pedras amarelas” com muito humor.
E uma outra vez, na Espanha, passando por uma viela, uma placa me chamou a atenção. Um salão onde os pés eram mergulhados num grande e transparente aquário individual, repleto de peixes cascudos usados para ajudar na remoção das cutículas, era o Céu na Terra. Outro momento singular aconteceu em Christchurch na Nova Zelândia, me chamou a atenção uma portinha com o desenho de duas mãos entrelaçadas com unhas longas pintadas de vermelho. Uma boa manicure, pensei. Engano, ao passar pela bandeira de tecido leve cor vinho, pendurada na entrada, fui recebida, com um largo sorriso e uma massagem inesquecível nas mãos, pés e cabeça feita por uma senhora da linhagem Maori.
Na frente da minha casa de infância passava o ônibus elétrico que subia toda rua Augusta cruzando a Paulista. Só precisava convencer minha mãe que não entedia o porquê de eu querer ir de ônibus tendo todo o conforto de um motorista. O que eu queria era estar com muitas pessoas e poder ficar livre do previsível. A cartada final para a aprovação do elétrico era garantir que a mãe da Lilian, minha amiga, nos traria de volta.
Na última parada, bastava atravessar a rua para o outro lado da avenida, e lá estava a pequena loja Yamamura.
No fundo da loja, vários lavatórios e atrás deles cabeleireiras japonesas, todas com o mesmo uniforme e de cabelos curtinhos. Ficávamos na fila de espera, enquanto olhávamos hipnotizadas os diversos lustres que balançavam quando os clientes passavam. Presas por um barbante nos lustres compridos, as etiquetas de preços encostavam no topo das nossas cabeças e ríamos ao passar por elas.
Lilian e Lilian podem ir para o lavatório, falava a recepcionista que ficava num caixa entre os lustres e o início do pequeno salão. Minha cabelereira favorita era jovem, simpática, baixinha, gorduchinha.
Sentávamos e achávamos o máximo nossos cabelos serem lavados com sabão de coco em barra!
Lembro vivamente das cabeleireiras explicando os benefícios do sabão de coco e das toalhas meticulosamente enroladas ao final do último enxague. Quase não entediamos o que elas falavam, e vice-versa. Sorrisos eram o que sobrava do não entendimento. Mesmo com os cabelos repletos de soda cáustica, nos sentíamos integrantes do mundo das mulheres adultas.
Éramos felizes assim.