Conversava com uma amiga sobre o excelente documentário da Petra Costa, “Democracia em Vertigem”.
Uma cena, entre tantas tão tocantes e bem feitas, me chamou a atenção.
Três faxineiras limpam o tapete vermelho das escadarias do Congresso.
Enquanto limpam meticulosamente, sentadas nos degraus, mostram com as suas sensibilidades à câmera de Petra, a questão política que tomou conta das nossas incoerências.
As mãos delicadas passam o pano em cada degrau. Algo inimaginável no século XXI, no qual máquinas deveriam estar lá para ajudá-las. Limpam degrau por degrau na esperança-tão feminina-de dissolver ou despoluir o que, dia após dia, é construído com a falta de ética.
O que será desse tapete alguns minutos após a sua limpeza?
Solas imundas deixarão rastros sobre a singeleza do gesto. O poder no seu pior status apartado do bom senso. O mais simples e honesto gesto de esperança na renovação, e na inclusão dos menos favorecidos, pisado por solas antidemocráticas confeccionadas com !.
E no momento em que comentávamos sobre essa cena, outra cruza meu pensamento.
Uma empregada me conta a respeito do filme “Que horas ela volta”, sobre as patroas de suas amigas. “O que dói não é a patroa, ao voltar de viagem, mandar a empregada guardar as necessaires que ganha na executiva do avião, é no Natal a presentear com elas.”
“O que dói é saber que a patroa nos acha ignorantes. Que pensa que a gente não sabe o que é isso. Que não sabemos que é um presente dado à ela, no avião. Como se a gente, mesmo sem poder ter acesso, não soubesse do que se trata.“
Esse é o país que dá invisibilidade ao seu povo para os manter onde estão. Que faz da injustiça uma regra de ouro disfarçada com o infame nome de Meritocracia.
Neste exato momento, a impactante cena final do genial Lars Von Trier “Dogville”, surge, quem assistiu sabe do que estou falando.
Assim é a nossa humanidade, ou o resultado da falta dela.